abril 15, 2008

Resumo 1998-2007

1998:
Ponette - Jacques Doillon - França

1999:
The Thin Red Line - Terence Malick - EUA

2000:
Rosetta - Jean-Pierre & Luc Dardenne - Bélgica

2001:
La Pianiste - Michael Haneke - Austria/França

2002:
Mulholland Drive - David Lynch - EUA

2003:
Dogville - Lars von Trier - Dinamarca

2004:
Lost in Translation - Sofia Coppola - EUA

2005:
Million Dollar Baby - Clint Eastwood - EUA

2006:
Dare mo shiranai (Nobody Knows) - de Hirokazu Koreeda - Japão

2007:
Letters from Iwo Jima - Clint Eastwood - EUA

abril 13, 2008

Top 2007

Menção Honrosa (documentário):
Zidane, un portrait du 21e siècle - Douglas Gordon & Philippe Parreno – França
Sicko – Michael Moore – EUA
The Bridge - Eric Steel - EUA

Menção Honrosa:
Fay Grim – Hal Hartley - EUA
The Fountain – Darren Aronofsky - EUA
Il Caimano - Nanni Moretti - Itália
Little Children – Todd Field - EUA
Blood Diamond – Edward Zwick - EUA
Half Nelson - Ryan Fleck - EUA
Dear Wendy – Thomas Vinterberg - Dinamarca
Zodiac – David Fincher - EUA
Jindabyne - Ray Lawrence - Australia
Mysterious Skin – Gregg Araki - EUA
300 - Zack Snyder - EUA
Moartea domnului Lazarescu - Cristi Puiu - Roménia
Flags of Our Fathers – Clint Eastwood – EUA
Le Scaphandre et le papillon - Julian Schnabel – França
Paranoid Park - Gus Van Sant - EUA
The Namesake - Mira Nair – India
Control - Anton Corbijn - UK
Redacted - Brian de Palma - EUA

10.
Indigènes – Days of Glory
Rachid Bouchareb – Argélia
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9.
Sanxia haoren – Still Life – Natureza Morta
Zhang Ke Jia – China
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8.
Death Proof
Quentin Tarantino - EUA
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7.
Rescue Dawn
Werner Herzog – EUA
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6.
El Laberinto del Fauno
Guillermo del Toro – México/Espanha
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5.
Das Leben der Anderen - The Lives of Others – As Vidas dos Outros
Florian Henckel von Donnersmarck – Alemanha
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4.
Eastern Promises
David Cronenberg – UK/Canadá
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3.
Zwartboek - Black Book – O Livro Negro
Paul Verhoeven – Holanda
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2.
Lady Chatterley
Pascale Ferran – França
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1.
Letters from Iwo Jima
Clint Eastwood - EUA
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abril 12, 2008

No Country for Old Men

No Country for Old Men, 2008
de Ethan & Joel Coen
com Tommy Lee Jones, Javier Bardem, Josh Brolin, Kelly Macdonald
7/10
No Country for Old Men é a adaptção dos irmãos Coen ao livro de Connor McCormack, uma adaptação bastante literária, não que isso influencie a qualidade do filme, mas significativo dado que é apenas a segunda vez que os Coen baseam uma obra sem ser num texto seu (a outra altura, uma adaptação muito livre da Odisseia de Homero).

Existem alguns traços narrativos que estruturam o argumento de uma forma única que merecem uma referência:
- a falta de diálogo (ou diálogo esporádico) quando comparado com as inúmeras cenas de acção, em que vemos apenas os personagens fazer algo como oposição a falarem sobre isso, quase como sugerindo uma falta de razão para essas acções – acontecem porque têm que acontecer;
- a exposição narrativa proporcionada pela personagem de Tommy Lee Jones, que introduz vários pequenos contos como comentário, ou a procura de contar uma história para dar significado ao filme como um todo, como se o filme fosse uma analogia na procura de uma história para funcionar como paralelo aos contos de Tommy Lee Jones, enquanto este comenta os acontecimentos;
- a abordagem após o desaparecimento da personagem de Josh Brolin, numa sequência de alusões off-screen e pistas subtis sobre a sucessão de eventos

A cinematografia (de Roger Deakins, que na mesma altura foi responsável pelos excelentes “The Assassination of Jesse James by the Coward Robert Ford” e “In the Valley of Elah”) é magnífica, explorando a luz exasperante do sol texano nas vastas paisagens desertas, o elenco é magnifíco (Javier Bardem!) e a montagem (a sequência em que Brolin espera por Bardem no outro lado da porta – um longo take enquanto nada acontece e depois inúmeros cortes rápidos à la “Psycho” mal começa a acção) é magnífica também – mas o filme como um todo deixa algo em branco, talvez derivado da abordagem em relação ao final. Ao seguir o livro mesmo no seu fim enigmático, não posso deixar de pensar numa certa desresponsabilização dos Coen ao não tentar encontrar uma visão própria para o desfecho, mas também é verdade que numa história derivativa sem um foco central este tipo de fim aberto pode ser aceite.

É um território familiar aos filmes dos Coen, com referências à mala de dinheiro e tiroteios de Blood Simple, aos psicopatas de Fargo e as suas paisagens desoladoras, à intriga de Miller’s Crossing. Como se os Coen decidessem evocar o imaginário revisitado em outros filmes para tentar construir este filme, ao mesmo tempo que procuram desconstruir os signos do cinema americano moderno, reduzindo-os ao essencial.

Juno

Juno – 2008
De Jason Reitman, argumento de Diablo Cody
Com Ellen Page, Jason Bateman, Jennifer Garner
5/10

Juno é um filme que encaixa num sub-género recente com bons resultados a nível da crítica ou financeiro – o típico filme indie americano de baixo orçamento, com actores pouco conhecidos e com um argumento semi-crítico e sarcástico da sociedade de suburbia, sublinhado por música sóbria mas intrusiva. Ver Little Miss Sunshine, Thumbsucker, The Royal Tenembaums, The Squid & the Whale. Infelizmente, não está ao mesmo nível destes últimos, e nem sequer atinge o estatuto de cópia bem intencionada. A premissa, uma rapariga estudante de 16 anos que engravida e tem que lidar com as variadas reacções de uma miríade de personagens secundárias é interessante e poderia funcionar, mas entra num percurso demasiado perdido em detalhes que não são centrais à historia e não oferece um arco quer convincente, quer emocionalmente apelativo.

Qualquer argumento centrado numa história de gravidez tem um ponto fulcral: a cena em que a personagem considera um aborto e eventualmente decide não o fazer – e é aqui que Juno começa a desviar-se de algo mais profundo: não existe um sentimento de grande incerteza ou planeamento das consequências do resultado da escolha, nem envolvimento ou do rapaz ou dos pais, e o motivo, as possíveis unhas do feto (que “tanto” atormentam a rapariga durante os segundos que está na clínica, apresentado quase numa espécie de montagem explicativa mais típica de uma comédia de Hollywood) parece forçar a gravidez a continuar para... o filme poder continuar – não há nenhuma argumentação, como se a gravidez funcionasse como o macguffin do filme. Poderia pensar-se que isto seria compatível com uma historia do ponto de vista de uma adolescente de 16 anos que não se detém muito sobre o que fazer, numa espécie de raciocínio vazio próprio da idade, mas não é esse o objectivo, tendo em conta a maturidade e inteligência demonstrada mais tarde pela personagem.

É esta falsa perspicácia que torna o filme interessante, e que reside basicamente na actuação de Ellen Page, mas que é ofuscada por factores que interrompem a narrativa da história sempre que aparecem (e nos removem do seu ponto de vista), especialmente nas 2 personagens frívolas dos futuros pais adoptivos, meras caricaturas que ocupam demasiado tempo do filme. A mãe adoptiva, completamente obcecada para ter qualquer profundidade, e o pai adoptivo, uma colagem de referências de cultura pop com o qual se tenta criar uma frágil possível relação amorosa com Juno. É aqui que reside outra limitação do argumento: devido à quase ausência de relação entre Juno e o namorado, para manter a típica formula boy meets girl / boy falls for girl / boy loses girl / boy gets girl back, desenvolve-se uma insinuação a essa possível relação entre Juno e o pai adoptivo, que apenas tem carácter substituto para manter o enredo vivo; o factor “boy loses girl” que é sempre um pormenor idiota como um telefonema perdido ou uma situação que parece que é o que não é aqui limita-se à ausência de comunicação, e no fim a formula encontra a sua resolução esperada sem que exista qualquer desenvolvimento verdadeiro da relação original. Apenas uma variância do modelo de comédia-drama à Hollywood.

O diálogo inteligente e sarcástico de Juno é a principal característica do filme, mas infelizmente este estilo estende-se implausivelmente ao resto das personagens, eliminando uma maior diferenciação das personagens, resultando num efeito em que todas as personagens falam a uma mesma voz.

Sobre os enquadramentos, apenas 2 momentos relevantes: o plano distante com os corredores que se repete para introduzir as diferentes estações, que perde o seu objectivo subtil-sarcástico; e o momento em que Juno e a mãe adoptiva encontram-se no shopping e Juno pergunta à mãe se esta não quer sentir o bebé na sua barriga – corta para um plano de baixo para cima (ponto de vista da mãe) e outro plano de cima para baixo (ponto de vista de Juno) – demagogia de composição.

Lady Chatterley

ou Lady Chatterley et l'homme des bois
de Pascale Ferran, 2007
com Marina Hands, Jean-Louis Coullo'ch, Hippolyte Girardot

9/10

É uma adaptação ao livro Lady Chatterley’s Lover de D.H. Lawrence (mais propriamente à segunda versão - John Thomas and Lady Jane), uma adaptação sempre díficil (tendo em conta outras versões mais famosas pelas abordagens softcore) pois um filme de 2h50min principalmente contemplativo com uma narrativa menos linear que aparenta requer sempre alguma empatia por parte do espectador. Ou seja, pode ser uma fronteira ténue entre uma obra tediosa e pretensiosa e uma obra captivante e que cria laços afectivos com o desenrolar da história – requer algum envolvimento do espectador.

O primeiro ponto a favor é a complexa personagem de Constance, a Lady Chatterley do título que carrega todo o filme durante a sua duração com uma fabulosa interpretação de Mariana Hands, que acrescenta várias dimensões à sua personagem. É uma mulher presa a um marido aristocrata/empresário, que está restringido a uma cadeira de rodas após a 1ª Guerra Mundial. (um curto diálogo entre os homens num jantar logo no início estabelece eficazmente o status quo e a relação com a sociedade deste “mundo”)

É este um dos problemas de Constance, reduzida a tratar do seu marido como uma simples enfermeira, uma relação vazia de afecto.

É portanto uma história de procura de liberdade, de descoberta própria e do despertar de novas emoções, esquecidas e interditas.

Um dia, nessa procura de fuga à monotonia, num passeio pela imensa propriedade encontra o couteiro/guarda-caça a lavar-se. É o primeiro momento revelador do filme e tem um impacto profundo sobre Constance – o choque initial de um corpo semi-nu desperta nela um sentimento adormecido e à noite antes de se deitar, despe-se, e ao recordar a imagem que viu, examina o seu corpo num espelho, num plano em que toda a inquietação da personagem é vísivel. Está lançada a curiosidade e Constance introduz-se ao couteiro, passando mais tempo na sua companhia enquanto ele, desconfiado e intrigado lhe permite a aproximação.

A mera presença conjunta dos dois enquanto tratam de tarefas banais permite-nos ver como ela o descobre a cada dia que passa e como resiste à avaliação do seu marido sobre o couteiro como um primitivo bruto (outra interpretação soberba de Jean-Louis Coullo'ch, com resquícios de Marlon Brando), que de facto influencia a nossa percepção inicial da personagem, aliado aos maneirismos simplistas que este apresenta.

É neste período longo, cheio de insinuações mas em que nada acontece, como se nada fosse inocentemente acontecer, que a interacção tímida por parte de Constance e respeitosa do couteiro (afinal, ela é a mulher do chefe) permite desenvolver um preguiçoso e idílico desejo , enquanto ideias se desenvolvem nas mentes de cada um.

É pois natural o momento em que se desenvolve o primeiro contacto entre os dois, mas não deixa de ser revelador da delicadeza e ternura que a sua relação vai conhecer o modo como acontece, quando Constance se deixa emocionar com um nascimento de um passáro e ele a abraça. É também revelador o pouco diálogo que partilham no inicio: “É isto que queres?” “Estas coisas acontecem”.



Há uma evolução a vários níveis dos seguintes encontros amorosos entre os dois, que transborda para a o dia-a-dia de Constance na forma como este se comporta perante outros (e por exemplo, olha para outros, na cena em que espera no carro à porta da mina). Representa uma alteração na forma como Constance pensa acerca de si própria, de uma liberdade que ela se permite descobrir e de uma conquista de intimidade entre os dois. O primeiro encontro, com ela quase inerte e completamente vestida, passando por um encontro quase casual nos bosques e por outro de uma maior descoberta (e combinado quase de uma forma adolescente – quando passa a ser algo menos consciente e mais natural), até à cena de liberdade total e completa ausência de qualquer sentimento de culpa, em que os dois amantes correm nús pela floresta debaixo de uma chuva purificadora – um renascimento da consciência, numa cena com conotações paradisíacas.


Há um paralelismo óbvio entre o nascer de um romance e o ambiente circundante de primavera florescente e é algo utlizado com grande sentido estético por Pascale Ferran, com composições amplas envolvendo sempre elementos da natureza como os bosques, pequenos rios, flores isoladas que muitas vezes são também filmados de perto quando Constance lhes dedica atenção; as cores utilizadas reflectem principalmente esse ambiente primaveril e solarento, em que as cores das roupas de Constance contrastam com o cenário, focalizando o seu deslocamento inicial. As composições largas dão lugar a planos mais fechados sobre detalhes nas cenas intímas, interiorizando os momentos de paixão.

Outro aspecto que acentua todo o ambiente despretensioso e natural é a quase ausência de música, com a supremacia dos sons do campo. Existem algumas peças curtas de música, notavelmente durante a caminhada seguinte de Constance depois do primeiro encontro amoroso e outra em que ela toca ao piano enquanto o marido se barbeia – como se nos tivessemos esquecido que ela o sabia tocar. Existem também duas alturas em que são utilizados voice-overs, e a própria acção é dividida por inserts de pequenos textos, que acaba por funcionar eficazmente para gerir o ritmo do filme.



A afirmação de Constance não pode ser isolada de uma certa incapacidade do seu marido, fechado na sociedade aristrocrática inglesa-industrial do pós 1ª Guerra Mundial, com desdém pelas classes baixas que trabalham para ele (num diálogo deixa claro o que pensa sobre greves, diminuindo as dúvidas de Constance), numa fleuma acentuada na sua relação com outros, que quase atinge a sua própria relação com a mulher. Há uma cena fabulosa carregada de simbolismo em que este tenta passear pela propriedade numa cadeira motorizada, obstinadamente recusando qualquer ajuda, onde acaba por ser empurrado colina acima por Constance e o couteiro.

Finalmente, é de notar que para uma relação que começa quase timidamente, evolui sem grandes palavras, o filme acabe com um diálogo franco e revelador de fragilidades entre os dois.