Este ano existem vários bons filmes nomeados para os Oscares, a maioria com apenas 1 ou 2 nomeações, mas a categoria de Melhor Filme deixa algo a desejar: dos 5 nomeados não existe um relativamente forte nem sequer estão incluidos os melhores filmes com nomeações. Depois de nos últimos anos ter finalmente desaparecido o domínio dos grandes filmes comerciais dos estúdios de Hollywood (Lord of the Rings, Chicago, Gladiator), substituído por um maior reconhecimento do cinema independente e de maior valor artístico (exemplo de alguns filmes nomeados nos últimos anos: No Country for Old Men, Babel, Little Miss Sunshine, Capote, Brokeback Mountain, Good Night and Good Luck, Sideways, Lost in Translation) este ano o conjunto dos 5 melhores filmes, apesar de manter a tendência do domínio do cinema independente não incluí filmes de valor criativo ou inovativo perto dos nomeados de anos anteriores representantes desse cinema independente. Exite até algum reciclar de ideias já anteriormente reconhecidas (semelhanças entre Milk e Brokeback Mountain, entre Frost/Nixon e Good Night and Good Luck, entre Slumdog Millionaire e Cidade de Deus). Logo, podemos dizer que existe algum retrocesso na coragem da Academia em nomear filmes mais difíceis, de menor público.
Melhor FilmeSlumdog Millionaire - o grande favorito é um filme com um ínicio prometedor quando centra-se na pobreza e dificuldades das crianças na miséria de Mumbai, mas perde-se numa fantasia amorosa e vive de demasiadas coincidências, utilizando em demasia uma linguagem televisiva; o estilo videoclip de cortes rápidos e angulos exóticos parece decaldado do muito superior Cidade de Deus (5/10)
Frost/Nixon - um reinventar de factos reais do mesmo autor de The Queen, que explora o papel e responsabilidade dos media e tenta humanizar uma figura como Richard Nixon, sempre com um estilo muito contido, que vive das boas interpretações do elenco mas no fim não desenvolve nada de muito relevante (6/10)
Milk - um biopic bastante clássico do pouco clássico Gus Van Sant, sobre um tema nada convencional e quase tabu até há pouco tempo para a Academia. É um filme corajoso, cativante pela forma como é estruturado mas não é inovativo ou demasiado marcante (7/10)
The Reader - baseado num livro que fornece excelente material dramático e numa interpretação fantástica de Kate Winslet, perde-se nalguma demagogia narrativa, na forma como aborda a questão central do filme e numa realização que pode ser comparada a pintar através de números (5/10)
The Curious Case of Benjamin Button - é uma obra épica, quer na cinematografia ampla e composta, quer na narrativa que acompanha diferentes épocas, com base numa forte ideia inovativa e complexa, bem executada, mas que sofre ligeiramente com as tentativas de moralização e ideais suportados, demasiado próximos de Forrest Gump (Carpe Diem, life is like a box of chocolates, you never know what's coming) (7/10)
Previsão: Slumdog Millionaire é o grande favorito, desde que venceu o Globo de Ouro de uma forma quase surpreendente - é a obra global com potencial para atingir novos públicos e com uma mensagem optimista que agrada à Academia. Pessoalmente, não tenho grandes favoritos neste conjunto e apesar de alguma indecisão entre Milk e Benjamin Button, este último parece-me melhor desenvolvido.
Tendo em conta que os nomeados para melhor realizador pertencem aos mesmos filmes nomeados nesta categoria, a vitória parece certa para Danny Boyle. Uma surpresa há uns tempos atrás considerando os outros filmes deste realizador (Trainspotting, 28 Days Later, Sunshine), um prémio merecido se bem que pelo filme errado. O meu favorito nesta categoria é definitivamente David Fincher, outro nomeado com uma carreira pouco propícia a vencedor de Oscar (tal como Van Sant, mas com maior mérito considerando apenas os filmes deste ano).
Melhor Actor Mickey Rourke é o grande favorito, e merecidamente. O seu papel em The Wrestler é assombroso, qualquer coisa de extraordinário e certamente será recordado durante muitos anos. Sean Penn tem também uma performance muito forte (será o outsider nesta corrida) mas tendo em conta que já foi vencedor anteriormente não terá tantas hipóteses de vencer e em Milk não está ao nível de Rourke. Langella como Nixon faz um retrato/caricatura eficazmente solitária, tal como Jenkins em The Visitor, duas interpretações bastante discretas e sóbrias, que normalmente não chegam para vencer o Oscar. Brad Pitt por outro lado beneficia do carácter épico do seu filme que lhe permite explorar diferentes épocas e registos mas não será o suficiente.
Melhor ActrizKate Winslet é a favorita e também merecidamente nesta categoria, se bem que provavelmente deveria ganhar o Oscar pela sua interpretação em Revolutionary Road. Meryl Streep aparece como segunda favorita num retrato de uma freira, o tipo de representação caricatural que normalmente é suficiente para vencer, mas mesmo com o recorde de nomeações de Streep e da fantástica actriz que é não deve chegar para vencer - afinal já ganhou em anos anteriores e Winslet é outra recordista, mas que nunca ganhou. Melissa Leo é assombrosa em Frozen River e carrega todo o filme com a sua interpretação gélida, tal como Anne Hathaway em Rachel Getting Married, dois pequenos filmes independentes que devem limitar as chances de ganharem. Angelina Jolie aparece com uma performance bastante sólida mas nada de excepcional que lhe permita ser favorita nesta categoria.
Melhor Actor Secundário
Sem grandes palavras, Heath Leadger - a sua interpretação diz tudo num Joker assustadoramente descontrolado em The Dark Knight. Apenas Josh Brolin em Milk tem um papel que lhe permite competir pela complexidade da sua personagem, enquanto que os outros nomeados têm papeis eficazes mas pouco marcantes como Hoffman em Doubt ou Michael Shannon em Revolutionary Road. Nota para uma merecida nomeação de Robert Downey Jr, por interpretar a dude that's playing the dude that' disguised as another dude.
Melhor Actiz SecundáriaPenelope Cruz parece ser a favorita pelo seu papel em Vicky Cristina Barcelona, mas esta deve ser a categoria que está mais em aberto. Viola Davis em Doubt tem um pequeno papel (pouco mais que 10 minutos) mas muito forte e tem tido críticas muito favoráveis. Amy Adams também em Doubt será a menos favorita mas a construcção do seu papel em Doubt é muito mais díficil e emocionalmente comovente. Taraji Henson poderá ser outra surpresa e beneficiar do carácter épico da sua personagem em Benjamin Button, mas a sua interpretação nunca atinge notas verdadeiramente amplas. A minha favorita é Marisa Tomei, um excelente contra-ponto a Mickey Rourke em The Wrestler, uma performance díficil e ambígua; a vencer seria uma verdadeira surpresa.
Melhor Filme EstrangeiroEntre Les Murs (A Turma) é de longe o melhor filme nomeado, pelo retrato intimista, complexo e claustrofóbico de uma sala de aula parisiense. A Valsa de Bashir parecia ser o favorito, por ser um filme de animação e também por ser o filme nomeado por Israel, mas a verdade é que esta é uma categoria especial - para poderem votar nela os membros da Academia são obrigados a assistir a todos os filmes e acredito que pela força de Entre Les Murs poderá haver aqui uma surpresa. Revanche, da Aústria é o outro filme que vi desta categoria e é um merecido nomeado, pela variedade de emoções que consegue atingir e pela resolução final.
Melhor DocumentárioApenas vi 2 filmes mas são os mais relevantes nesta categoria: o favorito Man On Wire, um retrato fántastico da vida de Philip Petit e da sua obra-prima, ao atravessar num fio colocado a mais de 400 metros de altura entre as duas torres do World Trade Center sem rede de segurança, uma façanha mágica e certamente um momento único impossivel de repetir - o filme mostra a preparação e execução da proeza quer através de imagens de arquivo quer de uma reconstrução que consegue quase imitar um thriller, com declarações emocionais das pessoas envolvidas. Encounters at the End of the World leva Werner Herzog (de Grizzly Man) à Antárctica, num retrato das paisagens únicas e inquietantes e das pessoas invulgares que escolhem deixar o mundo para trás para viverem num local que proporciona elementos também impossíveis de repetir em qualquer outro lado, sublinhado pelas próprias palavras de Herzog que fornece através de um voice-over as suas próprias dúvidas e assombro em relação à natureza do local e das suas pessoas.
Man on Wire será o favorito, mas a sensibilidade artística e curiosidade intelectual de Herzog podem ser suficientes para convencer os votantes nesta categoria (que tal como o Melhor Filme Estrangeiro, requer que se assista a todos os filmes).