fevereiro 21, 2013

5 Broken Cameras (2011)

5 Broken Cameras

5 Broken Cameras de Emad Burnat e Guy Davidi, Palestina 2011, 9/10
nomeado para Oscar Melhor Documentário 2013

É desarmante, neste filme, a esperança que alguém carrega, na ideia de fazer a diferença apenas ao pegar numa câmara. 5 Broken Cameras podia ser apenas uma história simples. Um pai que se dedica a registar os primeiros passos dos seus filhos, e gravar o quotidiano à sua volta para memória futura, seria normal - não fosse o caso desta família viver em Bil'in, uma pequena aldeia palestiniana, perto da fronteira com Israel. Emad, realizador, cameraman e técnico de som, é a alma deste filme. A consciência do filme pertence a Guy Davidi, responsável pela edição e texto do filme, que descobriu Emad, e as horas de filmagens que este tinha gravado, numa visita a Bil'in. Depois de analisar as imagens, Davidi encontrou uma narrativa que ligava intimamente os acontecimentos nesta vila com a vida de Emad, dirigindo o filme nesse sentido e dotando-o de um voice-over sóbrio, revelador do efeito desgastante que o conflito tem sobre os que lhe são próximos.

As câmaras de Emad contam várias histórias e todas contêm um drama próprio. Mas Emad não é só a pessoa por trás da câmara, é a pessoa por trás da câmara quando esta é destruída por um colono israelita, ou por uma bala disparada por um soldado israelita. A metáfora não podia ser mais evidente: é a câmara que salva a vida de Emad, não só ao agir como um escudo que o protege, mas como uma entidade através da qual ele consegue resgatar a violência e o desespero do quotidiano para o filme, para que ausentes, como nós, se tornem, também, testemunhas. Emad constrói, desta forma, um documento vital de uma realidade esquecida pelo resto do mundo, cansado de um conflito que parece não ter fim.

Ao capturar os eventos que assistimos durante o filme, Emad não está só a garantir a importância da recusa em desistir de um povo, ao assegurar a sobrevivência da memória destas pessoas, mas também a dar sentido à sua própria existência, da única forma que conhece. Não raras vezes é a própria câmara que coloca Emad em perigo ou é a causa directa dos seus problemas: é agredido por causa dela, disparam sobre si, é preso, interrogado e forçado ao isolamento pelas autoridades israelitas, desconfiadas da sua câmara. A nível pessoal, causa-lhe dificuldades no casamento pela insegurança que o trabalho envolve, no relacionamento com outras pessoas que não vêem validação no seu trabalho, que confundem a sua persistência com obstinação inútil. São inevitáveis as dúvidas de Emad em relação a si mesmo, mas os seus companheiros de luta não desistem dele, oferecem-lhe novas câmaras quando alguma é destruída. Se é desolador verificar as mudanças na paisagem natural, que o avanço dos colonatos provoca nos arredores da vila outrora limpos de muros artificiais, é encorajador, pelo menos para Emad, verificar o número crescente de câmaras nos protestos semanais contra os israelitas.

Este é um filme que dispensa gráficos e mapas e entrevistas com políticos, tal é o poder das suas imagens.
Dedicados a um protesto pacifico contra o avanço dos colonatos e o roubo da sua terra, Emad e o seu grupo de amigos vêem-se perdidos numa série de jogos kafkanianos com as autoridades israelitas: tentando que as mesmas leis que se aplicam aos colonatos se apliquem a eles, procuram contornar as ordens israelitas. Apesar das intenções pacifistas, a brutal resposta israelita não deixa hipóteses: o olhar que a câmara de Emad recebe de volta dos seus filhos, a violência que cresce nos seus olhos como resposta à agressão israelita, encontra apenas resposta no desamparo de Emad - uma das primeiras palavras que o seu mais novo aprende é cartucho. Com o quotidiano registado em 5 Broken Cameras ficamos a conhecer as personagens da vila, as pessoas mais próximas do realizador, que tornam-se a sua família imediata através do companheirismo da resistência. Várias dessas pessoas são presas, outras são agredidas e pelo menos uma é assassinada - muitos sucumbem à pressão exercida por um autoritarismo absurdo. Numa das poucas visitas a Israel concedidas a Emad, por ocasião de uma deslocação a um hospital para tratar um ferimento, assistimos a cenas desoladoras, pela sua beleza simples: os seus filhos deliciam-se pela primeira vez com a praia, que está tão perto mas tão longe. Acima de tudo, a passagem do tempo é implacável, e a procura de qualquer esperança frágil. Mas este filme é também uma prova de resistência, que sobrevive através do seu visionamento.

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