Batman Begins (2005) de Christopher Nolan - 7/10
Batman Begins é um filme surpreendentemente liberal na acepção americana da palavra (ideologicamente de esquerda) nas suas políticas: não só Batman não é visto apenas como um vigilante que toma a justiça nas suas proprias mãos (uma ideia politicamente de direita, de substituição das instituições do Estado), já que a sua acção é justificada por um sistema completamente corrupto e tendencioso para a impunidade dos criminosos (e que o filme luta por expor), há toda uma necessidade em demonstrar as raízes socias da sua acção e a cooperação com os elementos certos da sociadade.
É evidente a necessidade do filme em demarcar-se da temática dos filmes anteriores – excentricidades artísticas carregadas de simbolismo e experimentalismo visual, centrados nas bizarras personagens sem grande desenvolvimento pessoal (style over story), resultado da influência de Tim Burton – focando o aspecto emocional e social da história.
Existe uma forte mensagem de condenação de vigilantes ou carrascos auto-nomeados evidente pelo forte confronto entre a posição de Bruce Wayne (pré-Batman) e a Liga das Trevas (encarnada na personagem de Liam Neeson), uma vez que estes últimos defendem uma acção segundo a sua justiça como resposta à decadência do sistema judicial-político, quase numa lógica terrorista de destruição - afinal é a diferença de soluções para o tratamento da situação actual de degradação de Gotham que leva ao confronto físico entre os dois e representa o arco principal do filme.
Por várias vezes os pais de Bruce Wayne são referenciados como tendo tido intervenções politicas no combate à pobreza através do papel da sua empresa para minorar a desigualdade, uma atitude quase proibitivamente socialista no cenário americano, sublinhado por uma compreensão em relação ao desespero da pobreza que pode levar à criminalidade, expresso quer pelo pai de Bruce quando é assaltado quer pela personagem de Katie Holmes, uma advogada honesta (representante do ideal de combater o sistema por dentro) confrontada com o poder corrupto que mesmo assim argumenta que é o sistema actual e o crime organizado que perpetuam/condenam certas pessoas à criminalidade numa espécie de ciclo viciado, que por fim leva Bruce a sobrepor a justiça dos fracos que não se podem defender em relação ao seu próprio sentimento de vingança, uma toda evolução ideológica desde o momento em vive apenas para a vingança sobre o criminoso que assassinou os seus pais até ao exílio que o leva a viver como criminoso e a roubar para não passar fome. Isto resulta na confrontação quer com o sistema existente quer com o grupo de vigilantes que condena todos por igual (que afirma o desprezo pelos inocentes, pois são todos culpados).
Toda esta moralização das acções do filme é acompanhada por uma forte componente anti-apatia (o repetido “You are what you do, not what you are inside” – as tuas acções são o que te define), evidente também na sua condenação da classe alta de Gotham pela sua apatia e indiferença para com a situação actual, sendo o combate a essa indiferença parte fulcral das suas motivações.
É pois uma versão renovada do extravagante solitário, e se é certo que mesmo assim é uma visão simplista ou demasiado generalizada das lutas de uma sociedade, condiz com as origens de banda-desenhada de Batman. O título “Batman Begins” pode desta forma aplicar-se não só às origens de Batman, mas também a um novo rumo na franchise.
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