janeiro 14, 2011

Winter's Bone

Winter's Bone, de Debra Granik, EUA 2010, 8/10


O minimalismo patente em Winter's Bone tem um único objectivo: deixar-nos sozinhos com a personagem central, uma indómita rapariga de 17 anos face aos elementos adversos que ela tem de enfrentar. Os planos longos e distantes, repetindo-se erodem a nossa resistência e delapidam a vontade de Ree, numa composição ambiental sem misericórdia, essencial para criar empatia com a personagem e também para delimitar a fronteira desta vida, estabelecendo a impossibilidade da ideia de um outro mundo. O notável em "Winter's Bone" é a facilidade com que nos perdermos no isolamento intemporal da situação das suas personagens. O filme tanto podia ocorrer há cinquenta anos atrás, como daqui a cinquenta anos, que não notariamos diferença - tal é a arrogância isolacionista do espaço - o que é suficiente para evidenciar o redutor ciclo que é vivido dentro do filme. Uma geração dá lugar a outra geração, repetem-se erros e fecham-se portas, enterram-se futuros.

No meio de rivalidades mundanas entre familiares, negócios de drogas, que apenas reforçam a precariedade de como se tenta sobreviver nesta comunidade, e sentimentos de impunidade, que se alimentam de vidas à margem da sociedade e da sua lei, fica apenas o vazio no centro. No meio de uma floresta de árvores solitárias, a luta de Ree em sustentar os irmãos mais novos é contrariada pela debilidade de uma mãe dormente e pela procura de um pai de corpo desaparecido. A lenta claustrofobia em que o filme nos envolve é definida na sua escuridão. Sempre num tom retraído de imagens que ardem, o interior profundo desta america esquecida é acima de tudo ameaçador. Entre assegurar a próxima refeição, sobreviver ao inverno frio e desafiar a rede de figuras locais poderosas que envolve a família próxima, para tentar desvendar o que aconteceu ao pai, Ree é castigada por personificar uma ameaça como alguém que se desvia da ordem instalada, que não se rende às evidências. É este perigo que encarna que é criminal para quem está habituado a esconder os males do seu modo de vida. À medida que vai sendo percorrido o caminho escolhido por Ree mostra-se implacável, mas tem de segui-lo até ao fim.

A exposição no filme sobre o que vai acontecendo e o contexto apresentado são diminutos, e muitas vezes o filme é contado através de silêncios demorados. É a dinâmica da investigação que sustenta o filme, mas são as feições feridas de Ree pelo vento gélido que revelam mais história que qualquer exposição conseguiria. É através deste balanço entre composição ambiental e narrativa nebulosa que o filme se alinha com uma corrente recente, que se destaca pelo ressurgimento de um estilo formal próximo do neo-realismo mas que se transforma num realismo quase onírico. Tal como Samson and Delilah ou Wendy and Lucy, estes filmes acrescentam ao objectivismo com que são filmados um cenário particular no seu isolamento, aludindo a um etéreo negro de Terrence Malick em Badlands ou Days of Heaven.


A cena mais importante do filme tem um impacto tão devastador precisamente pelas fronteiras que estabelece durante o filme. É a única cena que se desenrola temporariamente fora do cenário das montanhas, em que Ree se desloca a um centro de recrutamento do exército americano para averiguar as possibilidades de abandonar o mundo que conhece mas revela uma saída demasiado custosa - é o choque com um outro mundo real materializado naquela sala e o choque de não ter qualquer saída. Outras portas que se fecham.

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