Searching for Sugar Man, de Malik Bendjelloul, EUA 2012, 6/10
nomeado para Oscar Melhor Documentário 2013
Sugar man met a false friend
On a lonely dusty road
Lost my heart when I found it
It had turned to dead black coal
Rodriguez é o nome do Sugar Man do título do filme, uma das poucas coisas que se sabe sobre este desaparecido músico americano. Além dos dois álbuns que deixou, gravados em 1970 e 1971, muito pouco é conhecido sobre a sua figura. Entre as histórias à volta do músico baseado em Detroit, que se pressupõe ter sido um sem-abrigo que percorria os bares de guitarra às costas, destaca-se o que é contado acerca da sua morte. Duas versões alimentam o mito: que terá suicidado-se em palco, depois de despejar gasolina sobre si mesmo, imolando-se no fim de um concerto, ou então que no fim desse último concerto, tocado de costas para a audiência como era seu hábito, terá puxado de um revolver e disparado sobre si mesmo. Estas e outras histórias, contadas no início do filme, por diferentes pessoas que alegam ter visto Rodriguez ao vivo, ajudam a compor o retrato deste
singer-songwriter. No fundo, as poucas pistas deixadas para trás, que podem ajudar a explicar quem foi este espírito fugaz, são essencialmente as canções que deixou para trás, cujas letras incidem sobre drogas, indigência e uma aparente depressão incurável. Repletas de desespero, jogam com as poucas fotografias herdadas das capas dos álbuns, que revelam uma figura envolta em mistério. Apesar do falhanço rotundo dos seus dois álbuns, Rodriguez é considerado pelos produtores que trabalharam de perto com ele em Motown como um dos músicos americanos mais talentosos de sempre - e falamos de produtores que trabalharam com Marvin Gaye, Stevie Wonder ou Peter Frampton. Se Rodriguez foi completamente esquecido na América, foi transformado em figura de culto numa África do Sul dominada pela censura. Os seus álbuns eram aí fruto proibido, trocados entre os jovens sul-africanos à procura de uma voz que enunciasse o que sentiam, e as suas músicas
anti-establishment chegam a ser usadas como hinos para manifestações. Rodriguez é adoptado com uma espécie de Bob Dylan por essa geração sul-africana a tentar escapar do apartheid, o que valeu-lhe níveis de popularidade acima dos Rolling Stones.
Este é um documentário dentro do género musical, mas antes de ser um filme sobre Rodriguez é um filme sobre a procura de respostas em relação à sua figura, e sobre a influência que a música pode ter na vida de diferentes pessoas, como factor singular de libertação. Primeiro em Detroit, onde o realizador entrevista habitantes de uma cidade em ruínas, que revelam os vestígios da sua música sobre a população predominantemente de classe operária, onde restam ainda rumores acerca do destino de Rodriguez. Depois na África do Sul, acompanhando de perto dois dos maiores admiradores do músico (um jornalista e um coleccionador), à medida que estes procuram respostas para o enigma. Examinando exaustivamente as poucas pistas ainda disponíveis, partem numa investigação-expedição, vasculhando as letras e os créditos dos álbuns, à procura de sinais e de pessoas que possam ter conhecido Rodriguez. E a verdade é que à medida que vamos aprendendo mais acerca da pessoa, mais do que do músico, começa a desenhar-se um retrato de alguém fascinante na sua complexidade. Rodriguez, filho de um emigrante mexicano, parece nunca ter-se adaptado à realidade americana, mas ainda menos aos jogos do mundo da música. Apesar de todo o seu talento, passa ao lado de uma carreira com maior reconhecimento, mostrando que muitas vezes no universo comercial da música, isso não é suficiente: será também um símbolo da aleatoriedade com que se fabricam mitos e génios. O filme é composto por várias entrevistas, paisagens filmadas nos locais de interesse, excertos de música e imagens de arquivo. Não anda muito longe da linguagem televisiva (e das biografias musicais), mas permite assistir de perto ao papel redentor da música, da sua influência duradoura e a felicidade pura que traz a quem permite-se envolver pela mensagem da obra. Porém, paralelo a esta celebração do papel da música, há sempre presente uma desvirtuação da mensagem do filme, quer pela manipulação dos factos para garantir um maior suspense, quer pelo adorno em relação ao que realmente poderá ter acontecido.
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