janeiro 07, 2009

Burn After Reading (ou antologia Coen)

Burn After Reading - 4/10
de Joen & Ethan Coen


É notável a diversidade da obra dos Coen: com Blood Simple (8/10) tiveram uma primeira obra marcante que estabeleceu desde logo a capacidade em criar um universo próprio para cada filme, explorando o gosto por detalhadas composições com setups visuais cuidados (o famoso plano das balas que ao perfurarem a parede abrem pequenas linhas de luz na escuridão); obras fortemente estilizadas, apropriando-se de linguagem e símbolos de determinados géneros, como em Miller's Crossing (6/10 - manual de filmes de época sobre gangsters), ou The Hudsucker Proxy (6/10 - investimento noutro filme de época, américa nos anos 50, num ambiente com tom de fantasia ampliado pelo uso de slow motion e manipulação do tempo), ou até The Man Who Wasn't There (5/10 - manual de luz e sombras num filme a preto e branco, com tons de film noir) e Oh Brother Where Art Thou? (8/10 - réplica de outra altura da história americana, com experimentação em tonalidades anormais e introdução de elementos musicais), obras onde por vezes o conteúdo visual arrasa o pouco conteúdo narrativo, mas mesmo assim sempre obras interessantes pela amplitude e multiplicidade das ideias visuais, uma vez que cada obra contém um pequeno mundo construído de raiz pela imaginação dos Coen, em que os personagens são parte integrante e produto da época descrita.

É também notável a variação entre temas e tom adoptado nos diferentes filmes: desde obras sombrias e duras (Blood Simple, Miller's Crossing, The Man Who Wasn't There), onde a estilização absoluta domina o argumento que muitas vezes recorre a influências do género de filme escolhido (a história pouco original de filme noir para o filme preto e branco); a comédias muito mais típicas na sua estrutura (Raising Arizona - 8/10, exagero da criminalidade idiota e retrato do sul; The Big Lebowski - 9/10, elogio à preguiça stoner californiana com mais criminalidade idiota), que facilmente obtém resultados fantásticos quando o estilo acompanha o lado caricatural das personagens e eventos; incluindo obras que misturam um tom narrativo sério mas inspirado em temas e escolhas visuais mais exóticas, quer na criação de personagens e de uma linguagem visual única, adoptando pontos de vista emocionais fora do normal que contribuem para uma visão única no cinema americano recente (Fargo - 10/10, a corrupção da violência e ganância num cenário único; Barton Fink - 7/10, um escritor novo em Hollywood começa a ter pesadelos reais; No Country For Old Men - 7/10)... no entanto existem também filmes intermédios, quase inconsequentes, que não acrescentam nada de novo e não resultam da construção do tal mundo próprio mas antes tangentes a realidades mais comuns de outros filmes e que habitualmente nos Coen aparecem em experiências na comédia: The Ladykillers (5/10), Intoreable Cruelty (4/10) e infelizmente, é o caso de Burn After Reading.

Depois do Oscar para melhor argumento ganho com Fargo, um momento até então impensável para o cinema indie americano, os Coen fizeram uma comédia despreocupada e pouco "digna" de um vencedor de Oscar, tendo em The Big Lebowski um dos seus maiores sucessos: aí, a liberdade criativa e a liberdade em relação a expectativas de agradar aos críticos e público do mais intelectual Fargo permitiu-lhes criar uma colecção de personagens e eventos caricaturizado ao máximo (o Jesus de John Turturro), com devaneios formais (as cenas dos sonhos de The Dude). Depois do ainda mais intelectual No Country For Old Men com o qual ganharam o Oscar de Melhor Filme, a ideia terá sido a mesma, mas com tons de tentativa de agradar aos que admiraram a sua dissidência original em relação a Fargo, com novo escape pela comédia exagerada, mas o resultado fica longe do alcançado com The Big Lebowski: um início promissor, com a ideia de explorar o conceito de uma cidade como Washington, onde grande parte da população ou é político ou trabalha para um ou está envolvido com uma qualquer agência secreta ou é jornalista, abordado muito ao de leve logo no início num diálogo durante um jantar, mas o enredo acaba por fixar-se em 3 funcionários de um ginásio local (entre os quais Brad Pitt, num dos poucos pontos interessantes do filme, e uma Frances McDormand deslocada) e os seus comportamentos quase deliberadamente idióticos (junto com piadas inócuas sobre relacionamentos e preocupações sobre aparência pessoal), com a personagem de George Clooney cujo papel parece ser o de confundir o espectador e um Malkovich a repetir o estereótipo de excêntrico loser. As aventuras das personagens têm alguns momentos verdadeiramente engraçados quando envolvem a ideia de conspiração internacional mas o mais desapontante é o final e a personagem do Chefe que vai fazer sentido de toda a trapalhada, ou melhor, explicar que a trapalhada dos outros não faz sentido nenhum apesar de ser a razão de ser do filme - uma má colagem da personagem do cowboy em The Big Lebowski, que aparece no final do filme a comentar sobre a história, a explicar que a vida é assim e não há nada a fazer...

2 comentários:

ana disse...

ADOREI este filme :)

imartins disse...
Este comentário foi removido pelo autor.