Beixi Moshuo (Behemoth, 2015), de Zhao Liang, China 8/10
visto no Porto/Post/Doc - texto original aqui
Behemoth é o nome de uma criatura mitológica que se alimentava de montanhas e não é por acaso que Beixi Moshuo (Behemoth, 2015), de Zhao Liang, exibido na competição, começa com uma série de explosões numa mina, avisando que neste filme o homem substitui-se ao monstro destruidor. Numa adaptação livre do texto da Divina Comédia de Dante, a terra transformada pela intervenção do homem surge como a imagem de um inferno desolado, numa sucessão de imagens de uma beleza natural aterradora, como uma imagem rasgada a meio pela divisão entre as pastagens verde e o negro do carvão minado. O filme intercala imagens alternadas da realidade, onde um corpo nu deitado no chão rodeado de espelhos serve de ilustração para uma voz-off que entoa frases poéticas, com imagens documentais que mais parecem uma realidade alternativa. Confrontados com os confins negros das minas de carvão, substituto do purgatório, e dos trabalhos infernais numa metalurgia, parece que estamos a ver um filme de ficção científica, como se estivéssemos a observar um planeta estranho e irreconhecível, no meio de uma escala difícil de compreender para o olhar humano.
Perante este panorama desolador, o filme atribui um lado humano à sua composição, que sobressai pela sua mensagem, quer pelos rostos dos mineiros cobertos de negrume, que todos os dias inutilmente tentam lavar da sua cara e dos seus corpos, quer pelas histórias humanas que começam a aparecer, este é o mito de Sísifo moderno. Quando Zhao Liang filma uma cidade fantasma de prédios novos nunca ocupados, perante os rostos e as mãos destruídas dos trabalhadores sacrificados, as consequências desta aniquilação ambiental são assombrosas, como um murro. Apesar de toda a sujidade e negritude que as imagens finais evocam, como os frascos de líquido negro retirados dos pulmões de trabalhadores doentes, estas não podiam ser mais claras: este caminho é o da asfixia.