Concerning Violence (2014) de Göran Olsson, Suécia/EUA, 9/10
visto no Porto/Post/Doc - texto original aqui
Concerning Violence (A Respeito da Violência, 2014), o filme da sessão de abertura oficial, de palavras fortes mas imagens ainda mais fortes, é uma inquietante e arrasadora investigação aos efeitos da colonização de África pelos países europeus e às cicatrizes que ainda perduram. Göran Olsson volta a debruçar-se sobre outra história mal resolvida, depois do anterior The Black Power Mixtape 1967-1975 (2011), mas se aí as imagens de arquivo a que recorria eram acompanhadas por depoimentos de pessoas envolvidas nos acontecimentos, aqui as imagens têm um encontro feliz com um texto adaptado ao filme, ao pegar nas palavras do livro Les Damnés de la Terre. O filme começa com um prefácio que contextualiza o trabalho de Frantz Fanon, o autor do livro publicado em 1961, ano da morte do seu autor, com apenas 36 anos, e que faz desde logo a crítica ao filme, alertando para o simbolismo de algumas das imagens que iremos ver. São estas imagens de arquivo, recuperadas e ressuscitadas para este filme, que, juntamente com o poder descritivo e narrativo do livro, traçam um rumo da história que o filme pretende abordar, e desenvolvem a tese incriminatória do papel europeu. O texto refere como esse papel passou desde sempre pela exploração africana pelos países europeus, desde a escravatura até à colonização, que continuou mesmo depois desta acabar, até ao fim do século XX, com a apropriação económica dos recursos naturais do continente, a única forma que a Europa conheceu para se enriquecer. As imagens que acompanham o texto servem para acentuar as palavras, como quando vemos os negros em África como servos dos europeus brancos, como não-pessoas – é também a humilhação como forma de violência, a abrir feridas psicológicas.
O filme estrutura-se através de um jogo duplo entre as imagens, como quando uma sequência responde à anterior, contrapondo uma imagem de miséria negra com uma imagem de prosperidade branca, entre imagens de cenários de guerra e cenários de férias, como um campo/contra-campo entre duas imagens distintas, assim como entre as imagens e as palavras. Este jogo contínuo acompanha os diferentes sentimentos evocados pelo texto, como quando vemos a imagem inesquecível de uma mulher negra amputada a amamentar o seu filho, ou quando contrasta imagens de feridos africanos com feridos do lado europeu. Estas imagens esquecidas querem lembrar que nesta história não há vencedores, apenas explorados e exploradores. A parte final do filme incide sobre a visão de Fanon segundo a qual qualquer emancipação terá que passar necessariamente por um novo paradigma de desenvolvimento humano, porque a Europa não é um modelo a seguir. Olsson aproveita uma entrevista de um militar africano que explica como os empréstimos do FMI são uma forma de continuar a colonização, e que num discurso ressonante, parece estar a falar para os portugueses, sobre uma nova colonização que acontece agora dentro da europa.
Sem comentários:
Enviar um comentário