Last Days in Vietnam (2014) de Rory Kennedy, EUA 5/10
nomeado para Oscar Melhor Documentário
Last Days in Vietnam mostra-nos um relato dos últimos dias da
presença americana no país, e os esforços levados a cabo nas últimas horas para
evacuar do país o maior número possível de pessoas. Um filme que prolonga a
tensão dramática ao compartimentar a história que conta em pequenos episódios
que se sucedem, é também um filme que compartimenta a história da intervenção
americana no Vietname, ignorando a discussão sobre os acontecimentos da guerra
até ao momento em que começa a acção do filme, focando-se apenas naquela que
foi possivelmente a única boa acção americana durante o confronto, mesmo que
nem isso seja evidente. Se é uma decisão que se pode respeitar, ao assumir essa
parte ignorada do confronto como algo conhecido e parte do passado, não deixa
de ser desconfortável assistir aos depoimentos de pessoas envolvidas nesta
acção a falar de factos descritos como heróicos, no salvamento de inúmeras
vidas (ou melhor, cerca de 77 mil pessoas), sem referir a culpa no que percurso
que levou até esse momento, ou mesmo o desastre que esteve perto de acontecer.
Depois da assinatura de um cessar-fogo e da retirada massiva das tropas
americanas do país, a presença americana ficou reduzida à embaixada em Saigão,
ao pessoal de apoio e alguns militares destacados para protecção da mesma – ao todo,
cerca de 5 mil pessoas. Dois anos após o acordo, a frágil paz no país é
ameaçada pelo avançar das tropas do exército do Norte em direcção ao sul,
desfeito de protecção depois da retirada americana, e à medida que se aproximam
de Saigão, a presença americana fica em perigo. É necessário começar a planear
a retirada final, mas não se trata apenas de salvar os americanos ainda presentes no
país, alguns dos quais que entretanto começaram famílias, como também ficam
ameaçados os vietnamitas que ou colaboraram com os americanos, ou que
combateram do lado do exército do sul, por medo das represálias por parte dos
comunistas do norte. Acrescentando ao problema logístico, há a questão de o
embaixador americano no país, a figura de maior autoridade do lado americano,
se recusar a planear para a eventualidade de uma retirada total, por recear que
isso iria causar uma onda de pânico entre os locais.
Utilizando uma linguagem bastante
clássica, quase televisiva, que recorre à sobreposição de imagens de arquivo a
depoimentos de pessoas envolvidas, o filme consegue pintar um quadro claro
sobre os eventos. A grande mais-valia do filme são as imagens captadas por
equipas de filmagem no terreno, que são assim recuperadas e de um impacto imediato,
e que impressionam pela forma como para qualquer acontecimento que é relatado
por uma testemunha, existem imagens desse acontecimento, por mais improváveis
que pareçam. De facto, são pequenas histórias pessoais extraordinárias as que
são relatadas ao longo do filme. Depois de, numa primeira fase, se proceder à evacuação por avião de uma parte das pessoas que julgava-se ser necessário
proteger, ao perder o controlo do aeroporto com o avançar das tropas do norte,
é estabelecido um prazo de 24 horas para a retirada, e os locais começam a cercar
a embaixada americana. As horas finais serão repletas de actos improváveis e
desesperadas, quer dos militares americanos, que começam a transportar de helicóptero
todas as pessoas que transbordam os muros da embaixada para os navios
americanos que esperam na costa, quer dos locais, quando por exemplo tentam
chegar a esses navios pelos meios próprios, utilizando helicópteros do exército
vietnamita para transportar os familiares para os barcos.
Se a acção dos últimos militares americanos no terreno para salvar o número máximo de pessoas é de louvar, esta surge
apenas devido à falta de planeamento, e por oposição sucessiva a ordens de
superiores, quer da embaixada, quer de Washington. Daí ser ainda mais
frustrante a participação incólume de certos intervenientes da história no filme, especialmente
quando o realizador perde a oportunidade de os questionar sobre a sua
responsabilidade. Ao apresentar esta tábula rasa a alguns dos seus
protagonistas, o filme aproxima-se de um revisionismo perigoso, e retira
importância às acções das pessoas ordinárias que fizeram o melhor de uma
situação impossível. Fica também por perceber se o mérito do filme pertence ao
realizador, pela montagem de uma história dramática, ou se o verdadeiro mérito
pertence a quem capturou as imagens, já que elas próprias contêm a sua
história.
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